No último sábado, dia 10, rolou um evento da
Aquela Editora na Livraria Quarup, em Juiz de Fora, para a divulgação de seus últimos lançamentos: "Distância", do menino Otávio Campos e "
Trovadores Elétricos", de Anderson Pires, livros de poesia que ainda voltarei a falar por aqui. O encontro também contou com a presença de outros poetas da pesada, como André Capilé, André Monteiro, Anelise Freitas, Giovani Verazzani e esta pessoa que vos fala (cafona isso, né?). O que teve por lá você pode conferir
aqui e ainda curtir uma trilha sonora de responsa.
E no próximo fim de semana tem mais, olha só:
Deixo com vocês o texto que escrevi e li na última ocasião. Comentários, claro, são bem vindos.
Caderno de receitas
É preciso
escrever como se não bastasse pensar.
É preciso
fazer você, ouvinte, gozar e dizer: que foda, ele é poeta,
Ainda que
passemos o mês inteiro sem trepar.
De quebra, é
preciso que essa arquitetura aqui te faça refletir com a mão no queixo
enquanto
aquela outra voz, que conversa com a gente, revela que seremos obrigados
a aceitar o
fato de que somos assim, de que nos tornamos e nos tornaremos alguma coisa pelo
resto da vida, que precisaremos conviver com a pessoa que
deseja jogar-se
da primeira ponte que ver pela frente.
Mas calma,
há horas em que esse desejo é apenas para nos certificarmos da possibilidade de
flutuar.
E essa
máquina que é pra emocionar, gente, é falha.
Esse eu
menor, maior ou igual ao mundo é apenas teoria.
Mudam as
coisas, a nervura dos ossos, a tessitura da pele,
a biologia
do coração quando, no fim daquela tarde
que ninguém
dava nada por ela, o sol violenta a cortina de renda
e você,
procurando coisas banais pelos armários daquela casa,
encontra um
caderno de capa dura, com a natureza morta datada e assinada,
seguida de preâmbulos
manuscritos e receitas que, pela simplicidade e elegância com que foram bordados
nas folhas, tornam aquele instante e aquele único registro de quem só
completou as
séries escolares iniciais, prenhes de poesias e filosofias
tão
profundas quanto a nossa pele.
Existe
alguma estética do solavanco?
Qualquer
saúde é um pouquinho de amor?
Existe cura
para os problemas das cidades sem a loucura?
Conhecer a
si mesmo exige que nos desconheçamos,
A vergonha
de escrever, o medo de assumir a fraude que a cada dia constatamos que somos,
o fracasso
ininterrupto de horas jogadas ao vento, porque cismamos parecer inteligentes e
sensatos frente aos que não fazem nada além do que a selvageria acha de bom
tom: atacar!
E esse
ataque é esporte praticado. É também um pouquinho de saúde sem amor.
E esse encontrar-se
em estado de permanência
e evitar que
devires opressores falem mais alto e dite seus totalitarismos,
procura
impedir que nos tornemos aborrecidos ou ressentidos,
de que não
estamos fazendo análise de grupo, mas
é essa obra
não publicada que achamos em lugar inóspito
é que treme
em nossas mãos, que lemos e esvaziamos nossos corpos, perplexos,
e ficamos
ali sentados, fumando aquele cigarro que nos redime,
silenciando suas
palavras com outras palavras da ordem do silêncio,
plausivelmente
convencidos de que tudo, embora em movimento,
continua intacto
e registrado nos tapas que tomamos desses esbarros.